Histórias que não foram escritas

Orestes Nigro

"Síndromes"

            Na minha mais tenra Itápolis  ainda não padecíamos das paranóias que nos afligem hoje em dia. Ninguém se preocupava com as doenças do jeito que hoje nos levam a preocupar-nos. Havia doenças, certo, morria-se de pneumonia, de infecção intestinal, até de bicho do pé. Mas ninguém era internado porque tinha síndrome de pânico, sabe por que? Porque ninguém sofria disto. Não havia doença da moda! Hoje temos doenças da moda, e são várias. A pessoa tem um acesso de raiva, briga com a família inteira, aí levam ao psiquiatra e lá vem o diagnóstico infalível: “transtorno bi-polar”. O que tem de gente se tratando desta modalidade de psicose, é incrível. Síndrome do pânico então, nem se fala. E a depressão? Você vai encontrar uma vítima da depressão em cada 50m2. Será que é disto mesmo que sofrem?

            Nossa cidade vivia livre disto. E é fácil saber por que! Naquele tempo não havia uma faculdade em cada bairro “para melhor servir você!” Hoje os profissionais de saúde se formam em fornadas! É gente pra chuchu entrando no mercado de trabalho e é preciso inventar motivos para toda essa multidão de formados e deformados poder atuar. Faculdades se instalam até nos cafundós do Judas. Formatura antigamente era um acontecimento importantíssimo para as famílias dos formandos, para a sociedade onde havia uma faculdade. Hoje em dia é um acontecimento banal, tanto assim que os formandos trocam as cerimônias, a missa, o baile, por uma viagem para os novos inventos turísticos desta nação varonil, Porto das Galinhas, Vivenda das Piranhas, Garganta do Diabo.

            Naquele tempo não havia nem a praga dos advogados, que aconteceu depois, já nos anos 60, quando se dizia que no Brasil havia mais advogados do que gente. Nos anos em que tive a felicidade de viver na minha pacata terra, todo profissional, fosse ele formado nas escolas ou nas oficinas, era digno de respeito, sua atuação merecia o crédito das pessoas. Hoje em dia, você precisa ter muito cuidado na escolha do profissional que vai contratar, seja para consertar seu carro, seja para defender uma causa na Justiça, seja para tratar de um dente de leite, seja para realizar uma cirurgia. O quadro de profissionais está hoje eivado de picaretas, de “curiosos” que ouviram cantar o galo. Volta e meia você vê nos noticiários que descobriram um falso médico trabalhando num hospital. E não é num hospital qualquer não, é em hospital de grande porte, às vezes até em hospital referência no campo da saúde.

            Nesta verdadeira guerra de competição mercadológica, nesta briga de foice pela sobrevivência, o profissional sem escrúpulo inventa pesquisas, inventa descobertas científicas, inventa regimes de emagrecimento, inventa curas milagrosas, correções ortodontológicas, tratamentos psicológicos, terapias em grupo para  demover chifres de cornos, daí pra diante. É tanta picaretagem que os crédulos se perdem neste emaranhado de engodos.

            A nossa Mídia então, ávida de retorno promocional, acolhe tudo, divulga tudo, sem o mínimo escrúpulo, sem o mínimo critério, sem a mínima preocupação de  poder estar vendendo mercadoria falsa, estragada, contaminada pela mentira, pela sem-vergonhice. E esta parafernália que ela cria acaba deixando as pessoas confusas, perdidas, diante de informações contraditórias. Uma hora é a fruta que cura, meses depois a mesma fruta dá câncer. Aliás, por falar em câncer, eu cheguei à triste conclusão, segundo o que se divulga na Mídia, de que viver dá câncer. É verdade, tudo que você come, que você bebe, que você respira, dá câncer. Só esquecem de dizer que o grande câncer que nos ameaça é a desonestidade que hoje impera, é a mentira que nos impingem a toda hora, é a ignomínia que se apossou dos homens que nos dirigem a palavra, que nos manipulam o tempo todo na sua ânsia de lucro, de vantagens, de poder. E este câncer é alimentado pelo comodismo, pela burrice e ignorância dos que aplaudem a canalhice.