Histórias que não foram escritas

Orestes Nigro

Diário de Itápolis - Respeito!

N

Na minha mais tenra Itápolis, quando não havia psicólogos de plantão, salvos raríssimos e só nas metrópoles, os pais  concebiam o ato de educar como uma prática de autoridade e ponto final. Espelhavam-se nos seus pais e seguiam os mesmos preceitos. Pai que é pai tem que ser obedecido, tem que ser respeitado, tem que fazer o filho ou a filha abaixar a cabeça quando falam com ele. Responder? Nunca! Chegar assim falando com o pai, ou com a mãe sem pedir licença? Ah!  isto não! É falta de respeito. Chegou visita, está aí um senhor que veio falar com seu pai? Você já sabe o seu lugar: longe dali, que não é lugar pra criança. Mesmo que vc tenha 15, 18, 21 anos. Você é filho, tem que obedecer as regras, seguir os costumes. Levantou-se, encontrou o pai ou a mãe, não pediu a bênção? Heresia, pecado mortal, você não tem mais pai? Você não tem mãe? Fumar na frente dos pais? O que é isto? Te dou um tapa na boca que você vai ver!

Hoje seu tio vem aqui em casa, com sua tia e seus primos! Você ia sair pra se encontrar com os amigos, você ia brincar com os amiguinhos da vizinhança?  Ia, disse bem,  você ia. Porque quando chegavam visitas, fossem parentes, fossem conhecidos, toda a família tinha que estar a postos para recebê-los, para fazer sala, para servi-los. Não tinha choro nem vela!

Seu pai ou sua mãe ficaram sabendo que você levou uns croques da professora, porque conversava durante a aula, porque brigou, porque respondeu? A reprimenda em casa vinha sem demora, conforme o temperamento do pai ou da mãe, poderia ficar de castigo, ou levar uma tunda. Para os pais daquela época, professor era digno do maior respeito, professora era uma verdadeira segunda mãe. Esta concepção dos pais de alunos transmitia segurança aos mestres, que sabiam que podiam ser enérgicos, podiam até dar umas regüadas, puxar as orelhas que seriam apoiados pelos pais.

Minha concepção de pai, pelo que vi no meu, era a de um tudo sabe, tudo pode, em tudo manda. O pai da gente raramente se aproximava do filho, dificilmente fazia um carinho, conforme este pai, nem falava com o filho e nem lhe dava o direito de se dirigir a ele. A mãe era a intercessora, por ela você fazia o seu pedido, a sua pergunta, o seu aviso. Em algumas famílias, principalmente nas de imigrantes italianos, o filho só alcançava o direito de conversar com o pai, quando começava trabalhar, trocando em miúdos, quando passava a contribuir na renda familiar. Aí sim virava adulto.

Eu já comentei com vocês que eu tinha inveja, uma inveja positiva, do Darci Brunelli, porque ele e o pai, Sr. Mário, passavam na calçada de minha casa conversando animadamente, apesar de ele ser ainda um menino, Não era raro ver o Sr. Mário andando ao lado do seu filho com a mão em seu ombro. Isto era uma preciosidade, digna de aplausos.

Meu pai, o Sr. Vicente, como a maioria dos pais daquela época, era bravo, quase sempre carrancudo, mas tido como um sujeito maravilhoso para os de fora. Dava até raiva quando alguém chegava pra gente dizendo: “Conheci seu pai, ele está instalando o banheiro lá de casa! Que homem agradável! Bem humorado! Que papo gostoso!” . Eu me perguntava então “será que é o meu pai mesmo que ele conheceu?”

Você vai pensar: este Orestes devia odiar o pai dele! Ou : como sofriam os filhos daqueles tempos! Nada disto, querido leitor. Este tipo de pai era o normal naquele tempo. Anormal era o jeito do Sr. Mário Brunelli. A gente encarava aquele comportamento dos pais como algo natural! Eu amava meu pai e ficava inebriado de felicidade quando, milagre!, ele me fazia um carinho, me tratava com doçura! Isto aconteceu algumas vezes e me fez esquecer todas as carrancas, todos os berros, todos os tapas n’orelha!  

Os tempos mudaram e mudaram em excesso, acho eu! Claro que aquela forma autoritária de educar, com aquela distância enorme entre pais e filhos não era o ideal, era desejável uma flexibilização nas ralações pais e filhos. E aqui eu falo pais,  mais me referindo aos pais homens, porque as mães, embora bem mais duras que as de hoje, eram o colo, eram o braço amigo, eram o carinho. Deve ser por causa desta grande diferença entre o pai e a mãe que a mãe é esta figura tão idolatrada no mundo inteiro.

Agora, mudar tanto a ponto de os filhos virarem os chefes da casa, se tornarem tiranos  de seus próprios pais; mudar a ponto de os filhos exigirem sempre mais, cada vez mais para si , impondo sacrifícios enormes aos pais, sem darem retorno a isto, acho uma catástrofe! Acho que este tipo de relação pais e filhos é que está gerando pessoas tão egoístas, algumas chegando às raias  da delinqüência. Violência contra os pais, contra os professores! Que mudança estúpida! Prefiro aqueles pais bravos e autoritários, eles criaram filhos bem melhores. Você tem dúvida?