Orestes Nigro
 

Histórias que não foram escritas

 

Diário de Itápolis - Respeito

Eu sempre suspeitei que quando se cria um dia especial para festejar uma categoria de pessoa é porque ela anda esquecida ou ignorada. Nos velhos tempos, na minha mais tenra Itápolis o calendário, a folhinha, como dizíamos, não registrava Dia das Mães, nem Dia dos Pais, nem Dia da Vovó, da Sogra, da Secretária, do Amigo, do Abraço. Nada disto existia.

E não se compara o respeito de hoje com o respeito que naqueles tempos a gente tinha pelo pai, pela mãe, pelo avô, avó, professor, médico, advogado, e todos que viviam e labutavam com dignidade e correção. Bastava um olhar e o pai fazia calar e por o rabo entre as pernas o filho desobediente, a filha rebelde. Bastava a mãe da gente chegar no pedaço, que aquela arte que estávamos fazendo findava imediatamente. O avô quando entrava na casa da gente era recebido como uma dádiva dos céus. Como a gente adorava nosso avô, nossa avó. O médico gozava de um prestígio enorme junto às famílias, os advogados eram cumprimentados com gestos de alta consideração. Na escola ou fora dela o professor, a professora, eram tratados como segundo pai, como segunda mãe. O aluno jamais pensava em reagir com palavrões, nem mesmo erguiam a voz para os mestres. Agredi-los então, nem em sonho, nem em pesadelo! Se você, jovem leitor, perguntar ao seu avô ou a um conhecido de mais de 50 anos, como eram as travessuras deles na escola, a resposta vai fazê-lo rir muito, tamanha a ingenuidade da traquinagem, se comparada às de hoje em dia.

Não era preciso marcar na folhinha o dia de presentear a mãe.  Mãe era uma instituição, nem era mais gente, uma simples mortal, mãe era sinônimo de bondade, de ternura, de carinho, todos os dias do mês, todos os meses do ano, todos os momentos de nossas vidas. Mãe era inspiração do poeta, fonte de criação do músico, do pintor. Pai era aquele monumento intocável que nos servia de exemplo, de guia, de proteção.

Vivi meus anos de infância e de juventude sem ter notícia de um caso de filho bater no pai, nem mesmo de dirigir-lhe um palavrão! Não se fumava na frente do pai, meu pai não fumava na frente do Nono.

Hoje com a folhinha recheada de dias disto, dias daquilo, o que você vê na TV, lê nos jornais, ouve no rádio, são professores agredidos na sala de aula, esposas espancadas pelos maridos ou similares (hoje temos mais similares do que maridos!), avó assassinada pelo neto dependente de droga, pai e mãe mortos pelo filho, pela filha, com traços de extrema crueldade.

Está mais que na hora de acordarmos para a descarada exploração comercial que está por trás destas datas especiais! Até quando vamos alimentar a ganância dos comerciantes entrando de alegres nestas hipócritas homenagens? Se no lugar da furadeira você der um beijo sincero no seu pai, o coração dele vai ficar exultante, porque carinho faz muito bem para o ego de quem o espera. Em vez do famigerado celular que ela nem sabe ligar, sua mãe espera o seu mais puro gesto de amor que vem com o calor de um abraço cheio de ternura.

É só você observar bem: preste atenção como aumenta a cada ano que passa a ganância de vender dos anunciantes da TV. Antigamente os anúncios natalinos entravam no ar em dezembro, os ovos de páscoa começavam a aparecer nos mercados um mês antes da Semana Santa. Agora as campanhas do Natal começam em outubro, logo vão começar em julho. As cores verde e amarelo venderam horrores durante a malograda Copa que passou. Ninguém se ateve à péssima preparação que tiveram nossos jogadores, objetos da vitrine dos empresários, dos cartolas e dos patrocinadores. Todo mundo entrou na onda e se fantasiou de patriota  bissexto, que lembra das cores da bandeira um mês a cada quatro anos! Somos clientes, fregueses, não somos gente! Somos manipulados como bonecos e entregamos nossas suadas economias com esta cara de palhaços que nos põe no rosto uma alegria efêmera, que não dura o tempo de um abraço, que é gratuito e muito mais sincero.

Nos velhos tempos não nos tratavam assim, porque todos respeitavam todos, sem dia da tia, do cunhado, do vizinho da direita, do vizinho da esquerda! E os comerciantes lucravam da mesma maneira e recebiam o respeito das pessoas.

Ainda hão de inventar o ano do filho carinhoso, a década do aluno respeitador, o século  do homem solidário!