Histórias que não foram escritas

Orestes Nigro

Pedras

Ita= pedra, polis= cidade > Cidade das Pedras, este é o significado da palavra que agrupa ita+polis, o nome desta terra querida e que começou chamando-se Fazenda Boa Vista, depois virou Curato (termo que indica que o povoado é assistido por um cura, o mesmo que padre), o nome então ficou Curato do Espírito Santo do Córrego das Pedras. Quando o povoado ganhou uma capelinha, o nome mudou para Capela Curada do Espírito Santo do Córrego das Pedras que logo virou vila e passou a se chamar Boa Vista das Pedras. Aquele povoado foi crescendo, virou paróquia e, nos primórdios do século XX (1900), por força de lei, seu nome foi simplificado para Pedras. Daí a virar Itápolis foi pouco tempo. 

Isto é história, está nos assentamentos,  nos arquivos. O que importa é refletir sobre um aspecto: nossa cidade é contemplada, desde que virou povoado, o apadrinhamento do Divino Espírito Santo, hoje seu padroeiro; também desde o começo a Pedra foi sua marca registrada. E sobre esta Pedra se construiu uma cidade, se constituiu um Povo, formado de famílias, de empresas, de homens, mulheres, gente que contribuiu, está cooperando e seguirá produzindo coisas, saberes, arte, sentimentos os mais diversos, enfim gente que moldou e molda o corpo e a alma de uma comunidade.

As pedras sobre as quais foi erigida nossa urbe desapareceram sob o torcrete, sob o asfalto, não se vêem como antes, mas estão no alicerce natural e forte que dá sustentação à sua existência material. Estão no subsolo deste torrão que nasceu e vive sob as asas protetoras do Divino.

Nós, os mais velhos, os da N’ idade, somos os privilegiados que vimos as pedras! Vimo-las rolarem pelas ribanceiras, pelas ruas poeirentas que desciam e que subiam bem mais íngremes que hoje, desbastadas que foram nos aterramentos que prepararam o advento das pedras que as cobriram, do macadame que virou asfalto. Somos nós as testemunhas dos constantes deslocamentos das pedras, algumas redondas, outras pontiagudas, pequenas, medianas e grandes, que brotavam do chão duro e amarelado, revelando em seus sulcos os veios grafite do ferro que delas se desprendia! Pedra-fogo, as chamavam uns, pedra-de-fogo, outros, quantas delas, enormes, vibrantes vimos passarem nas carroças com destino aos muros que  ergueriam. Lembro-me daquele pedaço da Avenida XV de Novembro (Valentim Gentil) que vai da esquina da Casa Lutaif até a esquina do Posto de Saúde, que era na casa onde o Igor cabeleireiro vende beleza. Na calçada da direita as casas foram construídas em plataformas altas sustentadas pelas pedras que lhe davam arrimo. Pedras negras, ´pedras amarelas, pedras de Itápolis, o que indicava que todos tínhamos a segurança deste arrimo, pois elas estavam embaixo de nós.

Era um espetáculo ver-se rolarem as pedrinhas e as pedras roliças que emergiam das ruas em descidas! Aquele trecho entre a Florêncio Terra e a Prudente de Morais, da Rua 13 de maio (hoje Rucieri A. Vessoni), que subia para a saída da
Roseirinha, por onde a gente ia à chácara encantada do tio Pascoal, aquela subida=descida era a mais rica em pedras, que se fossem de brilhante serviriam para ilustrar a cantiga de roda. Pois é, se esta rua, ah se esta rua fosse minha, eu não mandava ladrilhar nem asfaltar, eu a deixaria intacta, íngreme como antes, soltando ´pedras de brilhantes para minha saudade passar.