Histórias que não foram escritas

Orestes Nigro

"As famílias da velha Itápolis estão chegando"

 

Cumpre-me confessar aos meus leitores que, neste período de Festas, ao lado dos presentes que ganhei, da companhia dos filhos, netas e bisneta, da alegria natural desse período mágico do ano, tive também dois momentos de apreensão, na condição de cronista.

Vamos ao primeiro: em novembro realizou-se o Jantar dos Itapolitanos ao qual não pude comparecer. Dias depois, alguns amigos que lá estiveram, contaram-me que o volume 1 de meu livro, lançado em julho do ano passado, foi comentado durante o evento e revelaram também que alguns itapolitanos participantes manifestaram estranheza pelo fato de suas famílias não terem sido focalizadas por mim.

Antes de mais nada, é preciso que se esclareça que o Volume 1 de “Histórias que não foram escritas” não trata das famílias da Itápolis dos anos 30, 40 e 50; aquele volume dá ênfase a fatos históricos, modo de vida, estrutura educacional, comercial, cultural e artística de nossa cidade. Pessoas foram citadas, dentro deste contexto, pois tiveram participação nestes aspectos da vida da cidade.

O volume 2, que espero poder lançar anda neste primeiro semestre, será dedicado à família, tanto como instituição conceitual, como instituições de cunho sanguíneo. São tantas as famílias a serem focalizadas que já me veio a certeza de que só um volume não vai dar para contê-las.

O outro susto que levei aconteceu numa resposta a um comentário que fiz a uma postagem no Facebook. Tratava-se de uma questão linguística, teci um comentário sobre uma crítica a um pleonasmo (redundância), satirizada por alguém que, por distração, achei que fosse uma amiga que admiro muito; não vi que a mesma havia compartilhado uma postagem de terceiro.

A pessoa, fonte da postagem, respondeu explicando seu ponto de vista, perfeitamente aceitável, mas esticou sua resposta sugerindo que eu continuasse “com meu puxa-saquismo às famílias tradicionais de Itápolis” e outras alfinetadas.

É preciso, aí também, que eu esclareça aos meus conterrâneos, que não carrego comigo nenhuma discriminação de classe social; no plano ideológico todos seres humanos são iguais, perante a sociedade humana e perante Deus.

Essa minha posição me custou caro, tive minha carreira universitária truncada, sofri dezessete anos de restrições de todo tipo, com prisão de quase 90 dias, demissão de meus dois cargos conquistados em concursos, bloqueio por cinco anos de minhas contas bancárias, pesadelo que atingiu em cheio minha família com quatro filhos menores e  que só começou a se apagar com a absolvição unânime dos membros dos tribunais de primeira instância e pela sentença final por unanimidade dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), publicada em 09 de setembro de 1979.

Fui absolvido não por minhas convicções, mas porque não cometi nenhum dos crimes previstos nas leis de meu país. Minhas convicções continuam as mesmas.

Para mim, que vivo longe de Itápolis, que não dependo de nenhuma família e de nenhuma entidade da cidade e que escrevo essas crônicas movido pelo amor que desde pequeno dedico à minha terra natal, todas as famílias que conheci no meu tempo de criança e de jovem, tempo aí vivido intensamente, são todas tradicionais e têm enorme importância, sim. E merecem ser por mim homenageadas!

Faltam muitas ainda para dar por concluída minha obra! Preciso falar ainda, dando-lhes exemplos: da família da Zezé Faria de Mello, organizadora dos nossos “Jantares”, prima de meus primos; quero falar sobre a família de um amigo que me acompanhou nos bancos escolares, desde o primário até o fim do colegial, o saudoso Henrique Segundo Zabini, que foi registrado pelo Sr. Archimedes, seu pai, como Segundo, porque seu primeiro filho, também Henrique, não vingou.

Preciso me reportar à família Rodeguer, à família Dal Rovere, aos Micheletti, aos Montera, à família do Janes de Mello, à família do meu professor Dr. Arnaldo Maradei, à família do alegre e simpático Vicente Granucci, à família Sendo. Juntem-se a esses os que não citei,  enfim, são tantos, tantos; gente de todas as origens, de todos os cantos da cidade, de todas as profissões e credos, que nem imagino quantos volumes isso vai dar. Faço disso um pretexto para pedir a Deus que me garanta vida lúcida até fechar a escrita.