Histórias que não foram escritas

Orestes Nigro

Diário de Itápolis - Natal

Na minha mais tenra Itápolis Papai Noel era uma certeza; nós, crianças, nem de longe duvidávamos de sua existência! Cada um tinha seu Papai Noel imaginário, longa barba branca, bigodão saliente, o célebre gorro, muito vermelho nas vestimentas, estes traços valiam para todos. Mas Papai Noel não era igual para todos nós , não. Não era na aparência, nem na roupa que ele se transmudava. Era naquilo que ele nos trazia na noite de Natal!

A gente ia dormir bem antes da Missa do Galo, que começava à meia noite; dormíamos com um olho, com o outro a gente espreitava portas e janelas, na espera ansiosa pela passagem do velhinho. Quantos desejos habitavam nossos sonhos, quantos brinquedos, quantas bonecas, quantas maravilhas! Alguns punham os sapatos nos peitorais das janelas, outros os colocavam ao lado da cama. E a imaginação voava pela casa seguindo o trenó desembestado que descia do céu, não sabíamos de onde.

A noite da Véspera era de pura magia, de  desvairado encantamento. Os adultos perdiam toda sua importância: a noite da Véspera nos coroava de poder infantil,  era quando a criança reinava absoluta, alheia aos passos e aos gestos dos mais velhos. A sabedoria do cansaço nos sedava, éramos mergulhados num sono profundo, tudo para que o dadivoso velhinho pudesse entregar as suas prendas!  E como era gostoso acordar pela manhã e deparar com a nossa encomenda bem alí, aos nossos pés, melhor dizendo, em nossos sapatos!

Mal tomávamos o café da manhã e já corríamos para a calçada a exibir nossos troféus! Era um desfile de bonecas, bebês enormes, carrinhos de dar corda, miniaturas de caminhões, velocípedes, bicicletas de duas rodas, toda sorte de brinquedos. As calçadas da nossa terra se  transformavam numa passarela  por onde desfilavam os mais ricos brinquedos, os mais modestos carrinhos de madeira, as mais luxuosas bonecas, algumas até de porcelana, e as mais pálidas bonecas de papelão. E também desfilavam os meninos e meninas de mãos vazias, meros expectadores da alegria alheia. Esta era a nossa primeira visão das injustiças, o nosso contato com o desfortúnio, o nosso encontro com  o privilégio. E esta mescla de alegria e frustração ia despindo Papai Noel de seu vermelho alegre, que se tornava cinzento e triste,   ia alterando seu semblante bonachão que se tornava indiferente e distante. E esta mescla ia se estender para as mesas dos almoços de Natal, sem dúvida nenhuma. O nosso grande consolo era quando alguém dizia: “Hoje é Natal, nasceu Jesus, o Rei dos Reis, nasceu nu, nasceu numa manjedoura, chegou simples, sem ostentação! Aí surgia pra nós a verdade luminosa do legítimo Natal!

Bom Natal para todos os itapolitanos! Tornemos este dia o Dia de Jesus, do Menino Jesus, Alegria dos Homens!