Orestes Nigro
 

Histórias que não foram escritas

 

Diário de Itápolis - Futebol

Neste clima festivo e “patriótico” de Copa do Mundo, fico me lembrando de como era torcer para o Brasil nos velhos tempos! O futebol já era a paixão esportiva maior do nosso povo, mas não tinha a conotação da exploração política e comercial que tem hoje. Pra começar era muito precária a comunicação, o que tornava distantes e desconhecidos do grande público os craques da bola, os grandes esquadrões da época. Palestra Itália, que virou Palmeiras, Corinthians, São Paulo F.C. e Portuguesa de Desportos eram os quatro grandes do nosso estado, mas a cara dos jogadores, os uniformes, as grandes proezas nos chegavam dois ou três dias depois dos grandes jogos, pela via dos jornais.

Carmen Miranda Dalva de Oliveira Vicente Celestino Francisco Alves

Assim como não víamos as caras dos grandes ídolos da música popular, como Vicente Celestino, Sílvio Caldas, Orlando Silva, Carlos Galhardo, Chico Alves, Carmem Miranda, Isaurinha Garcia, Dalva de Oliveira, Araci de Almeida e tantos outros, dos quais só conhecíamos as vozes, os grandes sucessos, também tínhamos que imaginar a cara e o tipo dos mais famosos futebolistas.

 

Craques como Leônidas da Silva, o Diamante Negro, como era chamado o famoso centroavante do São Paulo F.C. que se notabilizou por ter criado o gol de bicicleta, Goalkeepers (goleiros) como

Domingos da Guia Julinho Botelho Oberdan Catani

Oberdan Catani, que era o orgulho dos palestrinos, velhos palmeirenses, beques como o Domingos da Guia, glória dos corinthianos, Julinho Botelho, ponta direita  maravilhoso da poderosa Portuguesa de Desportos, Jair Rosa Pinto, Servilho, Fredenheich, Bauer, Rui e Noronha, a famosa linha média do tricolor paulista, Og Moreira, Villadonica, Cláudio, Balthazar, nomes que povoavam as mentes dos torcedores, eram nossos heróis imaginários que só viravam imagens nos breves noticiários que eram exibidos no cinema, antes do filme principal, vez ou outra e com atraso de semanas. Você ia ver alguns lances do Choque-Rei, como era chamado o clássico entre Palmeiras e Corinthians, um mês e meio depois que a partida tinha acontecido. Então nossos ídolos da bola habitavam nossas mentes como figuras míticas.

O rádio era o grande e quase único veículo dos acontecimentos futebolísticos. E conforme as condições atmosféricas às vezes nem o rádio funcionava, sobrava uma tênue voz ao longe, entre as “estáticas”, ruídos típicos do rádio antigo. As vozes de um Aurélio Campos, Geraldo Bretãs, Ari Silva, Pedro Luís, Geraldo José de Almeida, do romântico Fiori Giglioti, do Edson Leite, do Flávio Araújo, pra citar apenas os “speakers” (locutores) do rádio paulista, nos chegavam longínquas, roucas, às vezes pipocando, o que tornavam as transmissões esportivas algo que irritava os que eram indiferentes ao futebol.

A primeira Copa do Mundo de que eu, menino de 6 anos de idade, tive notícia foi a de 1938, senão me engano jogada no Uruguai. A gente não tinha rádio em casa, como a maioria dos itapolitanos, então ficávamos no muro dos Armentano, ouvindo de longe aquelas irradiações tão precárias, nas quais o “gooooool” era como que um longo gemido no espaço.

Diante de tanta dificuldade de comunicação, restava-nos curtir os nossos craques reais, de carne e osso que faziam a grandeza e a fama do nosso histórico e valente Oeste Futebol Clube, entidade esportiva, cujos esquadrões sempre foram motivo de orgulho para nós, itapolitanos, como é até nos dias atuais. Nossos heróis estavam ali, percorrendo nossas ruas e praças, presentes em nossas igrejas, clubes e cinemas, eram reais e iguais a nós, simples, humanos, que jogavam pelo prazer de jogar, que competiam pelo amor à camisa e à cidade.

Da esquerda para a direita: Nivaldo Santana(mascote), Antonio Torricelli, Neco Faustino, José Santana, Miguel Santana, Ismael Nery Palhares, Angelo Marconi(Picareta), Silvio Vessoni, Herculano Santana, Emílio Ferrarezi, Pedro Benedito Fazzio, João Faustino (Lota) e Adelbe Negrão

Eram nosso orgulho jogadores como Pedro Fázio, becão direito que com o beque esquerdo Pierim Granucci  formavam o paredão quase instransponível do velho esquadrão. Craques da bola como o Torricelli, o Ganito, os irmãos  Santanna, o Herculano, o Otacílio, o Nivaldo, filhos do Sr. Pedro Santana, grande líder do Oeste daqueles tempos; e ainda o Hélio Lalaina, o goalkeeper Baratinha, apelido do Armando Semeghini, o Careta, o Irani, o Jovino, o Virgílio Palmitesta, que na verdade se chamava Vicente, e  Virgílio era uma homenagem ao grande craque de Palestra e de Corinthians, todos estes craques da bola eram os nossos ídolos. Eram mais antigos e já glorificados o Lota,  halfer esquerdo, o Herculano, o Laudelino, que de tão bom foi contratado pela Portuguesa, mas fugiu da concentração e furou o contrato, porque não agüentou ficar longe da terrinha/  tínhamos  o Lelo, franzino e tímido, mas que os entendidos diziam ser o mais técnico e clássico dos nossos oestinos.

O futebol que se jogava era de ótima qualidade, o Oeste era temido em toda a região, deixando longe os times do Rio Branco de Ibitinga, o C.A. Novorizontino, o Feitiço de Catanduva, e os times menores de Santa Adélia, Tabapuã. Ariranha.

Durante as Copas ninguém vestia as cores da seleção, que ainda não era o amarelo canarinho, não fechavam as escolas nem as lojas nos dias de jogo, mas os corações pulsavam com a mesma força e entusiasmo, sem sermos tentados ao consumismo oportunista de todos os eventos. E o Brasil jogava com brasileiros, porque quem escolhia quem convocar eram nossos técnicos e adjacentes e não os patrocinadores e as nossas seleções jogavam bonito, bem mais bonito!