Histórias que não foram escritas

Orestes Nigro

“Cem anos de simpatia”

             O tempo fez poucas marcas nesta figura tão rica em simpatia e popularidade! Vivendo nos baixos da Francisco Porto, privei muito pouco do convívio com ele, morador do Centro, mas sempre o admirei pelo que ouvia a seu respeito. O que me impressionava eram suas “tiradas” certeiras quando testado por algum atrevido ou mal criado mesmo. Na escola ouvi de crianças de sua família, falarem de sua imensa bondade, de seu generoso coração. O Mingo, grande em tudo, no tamanho, na força, na disposição para o trabalho, na honestidade, na presença de espírito, nasceu para viver muito mesmo, cem anos pra ele é pouco, há de ficar entre nós por muito tempo ainda!

Domingos Cardilli, o "Domingão"

              A vida ele vem atravessando com a galhardia dos que não temem a lida, as adversidades, os altos e baixos, as armadilhas deste mundo, nem cara feia de ninguém. Longe dele como sempre vivi, tive-o sempre como um dos meus heróis. No cinema Burt Lancaster era para mim o seu êmulo, por sempre representar o grandalhão de coração mole e por seus personagens destemidos; entre as figuras destacadas da vida pública, eu o comparei ao interventor Adhemar de Barros, por suas “tiradas” espirituosas. Enfim, o Domingos Cardilli sempre se destacou em minha mente imaginosa.

 

             Lembro-me, como se fosse agora, da noite em que meus colegas, o Baianinho (Geraldo Hauers), o Theodósius Chammas, o Oacir Ellero me arrastaram até um bar, perto do antigo Correio, ali no largo da Matriz, com o propósito indisfarçável de me dar um porre. Eu nunca havia entrado naquele bar. Entrei e um de meus colegas foi logo pedindo: “Põe uma pinga aqui pra ele”. E um moço grandalhão, cabelos levemente ondulados, segurando a garrafa com aquela mão enorme, sorrindo me falou: “Enche o copo que você aguenta, ou espanta seus amigos aí e toma um guaraná?” Do meu lado o Ganito foi dizendo: “Pode por pinga mesmo, Mingo! Ele tá estreando, vamos ver se ele enfrenta!” – Aquela hora eu estava conhecendo o Mingo, melhor dizendo o Domingos Cardilli. Foi ele que me serviu a primeira pinga de minha vida.

Domingos Cardilli, o "Domingão", ao lado de seus amigos na comemoração dos seus 100 Anos

Foi uma alegria enorme para mim, topar na primeira página do site do Valentim Baraldi, com a foto do Mingo e o anúncio de seu aniversário dos 100 anos! Logo me veio ao pensamento: este homem  deve ter muito mais histórias de Itápolis pra contar! Ele que deveria estar escrevendo estas crônicas!

           “Caro Mingo, talvez você não se lembre de mim nem um pouco, meu contato com você e com seus irmãos se limitou ao período em que frequentei a barbearia do Zezé Celli, ali do lado direito da Matriz, mas este convívio tão rápido não apagou a grande admiração que você sempre me causou. Desejo que você comemore intensamente esta proeza de atravessar um século de vida! Que você tenha saúde e disposição para poder gozar por muito tempo do convívio e do calor humano desta sua família tão benquista em nossa velha Itápolis!  Deus já provou que gosta muito de você, por isto lhe deu saúde e força para viver tudo que já viveu! Se é assim, Ele há de continuar protegendo você e o abençoando sempre e sempre! Meus parabéns!”