Histórias que não foram escritas

Orestes Nigro

Diário de Itápolis - Desculpas! Demorou, mas saiu!

Retomo hoje, 14 de julho, minha função de historiador bissexto, amparado na memória e numa vivência que já se foi há tanto tempo. Retomo no dia da Tomada da Bastilha, data histórica da Revolução Francesa, um dos movimentos populares de maior repercussão e conseqüências da história da Humanidade. Por causa desta “tomada”, que foi a invasão pelo povo de uma das prisões mais horripilantes da história, a Bastilha, famosa pelos seus calabouços onde sofreram torturas presos políticos que se opunham aos poderosos da Monarquia Francesa, por ter nascido neste dia histórico, minha filha mais velha, a Lília, foi por muito tempo chamada de “Bastilhana”, por alguns alunos meus que freqüentavam minha casa, em São José do Rio Preto. Ainda bem que esta brincadeira foi esquecida antes que ela começasse a entender o que ouvia, pois Bastilhana é ruim hem! Não condizia com aquele rostinho lindo que veio enfeitar minha vida.

Coincidências acontecem, e hoje, quando se comemora a libertação de presos políticos da França de Luís XVI e de Maria Antonieta, recebi carta-ofício do Governo do Estado de São Paulo, cujo texto transcrevo aqui abaixo:

“Sr. Orestes Nigro. A Comissão Especial, criada pela Lei nº 10.726, de 9 de janeiro de 2001, reuniu-se na Sala dos Conselhos da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania, em 16.12.2008, sob a presidência do Dr. Ricardo Augusto Yamazaki, e decidiu, por votação unânime, registrar, publicamente, o pedido de desculpas a Vossa Senhoria e a todos que foram relacionados neste documento, em nome desta Comissão, por conta dos infortúnios passados durante a época da Ditadura , nos processos julgados nesta data, conforme os seguintes pareceres:

(entre 9 pareceres): Processo nº 272.098/2008 – Orestes Nigro – recomendado conforme Lei 10.726/01.”

Este texto foi publicado no Diário Oficial de São Paulo, edição de 29 /06/2011, à página  1 (Atos do Governador), logo após o Governador Geraldo Alkmin assinar decreto referente.

Preciso dizer que, na época em que fui preso, processado e enquadrado na Lei de Segurança Nacional, tive meus dois cargos, conquistados em concursos públicos, arrebatados, ficando desempregado desde junho/64 do cargo de Titular RDIDP da cátedra de Língua e Literatura Francesa da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras do Sistema Isolado do Ensino Superior, hoje Unesp, e desde 10 de outubro de 1964 (dia do aniversário da minha filha Letícia), da cadeira de Francês do Instituto de Educação “Capitão Porfírio de Alcântara Pimentel” de Monte Aprazivel – desemprego que durou até 03 de março de 1980, quando reassumi a cadeira de Francês, por decisão, unânime em todas a instâncias, da Justiça, logo depois de ter sido reintegrado e aposentado pelo IBILCE de São José do Rio Preto, nome atual da antiga Faculdade de Filosofia.  A prisão em 02 de abril de 1964, a demissão dos cargos, a proibição de exercer a profissão em todo o território nacional (Ato Complementar 77 do Ato Institucional n° 2), a proibição de sair do país para trabalhar no Exterior, apesar dos convites oficiais,  tudo isto foi alardeado pela imprensa, tudo isto deu no Rádio, na TV, foi comentado pelas pessoas. Por causa disto muitos “amigos” e  “parentes” passaram a me evitar e eu era apontado na rua. Tres filhos pequenos e uma para nascer, o que me salvou foi a licença especial, vinda de Paris, para instalar, dirigir e lecionar na Aliança Francesa de Monte Aprazivel e mais tarde a de Votuporanga.

Mas esta notícia de agora, com pedido de desculpas por parte do Estado que me castigou, sem provas, sem processo, me destruiu a carreira universitária, me impediu de buscar trabalho fora do pais, esta notícia quase ninguém viu, a TV, o Rádio e os jornais não deram e nem vão dar.  Por isto peço-lhes licença pra eu mesmo divulgar.

Volto revigorado pelos acontecimentos e pelas demonstrações de carinho de vários de meus leitores, que me ligaram, me escreveram e me mandaram e-mails, destacando-se o texto tão gentil da Srª Neusa Maria Manginelli, publicado anteriormente. Um grande abraço a todos e vamos lá!