Orestes Nigro
 

Histórias que não foram escritas

 

Diário de Itápolis - Aventuras-II

Nos

Que pé de grão-de-bico que nada! Donde se ouviu dizer que grão-de-bico dá em árvore! Nem foi preciso me lembrarem,  eu mesmo estava achando esquisito chamar aquela árvore redonda, copada até o chão, onde a gente se escondia para matar aulas de ´[e de grão-de-bico! O nome da bendita árvore era crista-de-galo ! Por esta eu lhes peço desculpas.

A crista-de-galo era um ponto de referência para a juventude estudantil da época: era esconderijo pra fumar, pra namorar escondido, para uma porção de malandragens inocentes. Mas não era o único ponto de referência dos jovens não. Lá no fim da Campos Salles, quase na saída de Itajobi, à direita, tínhamos o Buracão. O Buracão era um terreno baldio, dentro de um corte de terraplenagem, onde a molecada e os marmanjos, em dias e horas diferentes, jogavam suas peladas. O moleque sumiu de casa? Ah! Vá lá no Buracão que ele deve estar lá ou jogando ou assistindo a um racha dos bons!

Capela de Santo Antonio em sua fase de construção, tendo à frente o incansável Frei Paulo Luig

Lá no alto da Vila Nova tínhamos o Largo de Santo Antônio, que tinha ao centro, sobre um pedestal de alvenaria, o Cruzeiro, como era chamado. Uma cruz de madeira simbolizava a fé dos moradores daquele que foi o primeiro bairro de nossa cidade. Ali também era um ponto de encontros de estudantes, não para bagunçar, mas para estudar em dias de prova no Valentim Gentil. Da minha classe havia um grupo que se encontrava ali para trocar idéias, um sabatinando o outro, outro lia o ponto em voz alta. Nosso grupo era formado pelo Elio Renesto, que morava ali por perto, pelo Baianinho (Geraldo Hauers), que vinha de sua chácara lá atrás do Hospital, na antiga saída de Taquaritinga, o Henrique Zabini, que vinha lá do alto da Avenida 7 de setembro, o Onivaldo Miqueletti, pra citar alguns.

Levantamento do Cruzeiro do Largo de Santo Antonio, no centro do terreno em frente à Capela

O Baianinho vinha de bicicleta, uma Monark azul novinha. E resolveu que eu devia aprender a pedalar. E, depois de várias voltas no terrenão do largo, lá fui eu pedalando pela Rua Boiadeira abaixo, quando avistei uma boiada que descia célere em minha direção. Ainda meio trôpego no guidão, entrei na Rua 13 de maio (hoje Ricieri A. Vessoni), em direção à cidade. E peguei um descidão cheio de pedras que se destacavam e rolavam, até que atropelei uma delas e perdi a direção: fui cair dentro do rio da Carlota, que corre na tangente da rua. Do leito da rua, até o rio devia ter, na época, uns 2 metros de distância. E no leito do rio havia pedras-fogo. Afinal estou falando da Cidade das Pedras! Eu caí no único vão que não tinha pedras! Não sofri um arranhão sequer. Saí dali, com a bicicleta nas costas, em tempo recorde! Na rua fui socorrido pelo Sr. Laurentino Mascari, que na época morava bem na esquina. Examinou-me dos pés à cabeça e exclamou: “Foi Deus que o protegeu, meu filho! Eu vi a sua queda, foi feia! Se você caísse sobre as pedras, nem sei o que teria acontecido!”  Examinamos os dois a Monark do Baianinho: não tinha um risco sequer, não sofreu nenhuma entortada! Não tive mais coragem de pedalar, voltei pro Cruzeiro empurrando a bicicleta. E fui direto me ajoelhar aos pés do Cruzeiro pra agradecer aquilo que, para mim e para o Sr. Laurentino, foi um milagre! O pessoal lá de casa não acreditava na minha história. Precisou que meu irmão Romeu fosse lá conferir e conversar com a minha testemunha ocular, para que acreditassem. Desta lição tirei duas conclusões definitivas: Deus existe mesmo e se tivesse, na época, que comprar uma bicicleta, compraria uma Monark!

Acrescento a esta história que, chegando de volta ao Cruzeiro, contei tudo pro Baianinho! Ele também não acreditou!