Orestes Nigro
 

Histórias que não foram escritas

 

Diário de Itápolis - Semana Universitária

Em cima da hora, estou escrevendo minha crônica pra tentar enviar em tempo. Não vinha na cabeça nada que me agradasse escrever sobre minha querida Itápolis, parecia que tinham esvaziado meu crânio. Ironia desta vida! As coisas acontecem sempre por uma razão. E agora, logo ao conectar minha internet veio a explicação pra todo este transtorno: na Caixa de Entrada do meu correio virtual cintilava o anúncio de uma mensagem do Lucas Gentil. Corri abrir, pois coisa que vem deste menino só pode ser coisa importante, no mínimo interessante. E era!

Reunião da AIA-1976

Da esquerda para a direita: Roberto Abdul Nour, Walter Martins Jr, Celso Zillo, Aloisio Gentil, Rubens Guzzo, Evaldo Kock, Celso Benini, Bento Ary Bellentani

O Lucas me mandou a programação da 40ª Semana Universitária promovida pela AIA (Associação Itápolis Acadêmica) e vai acontecer de 17 a 24 de julho agora. Li item por item do calendário do evento e senti, mais uma vez nesta vida, grande orgulho de minha querida gente.

Numa época em que a sociedade humana sofre o maior surto de consumismo materialista, numa fase da história humana em que o que importa são os números, as quantias, as quantidades, os gráficos estatísticos, em plena era do famigerado “custo-benefício”, quando as reportagens da mídia se preocupam mais com o custo do que com o benefício, a gente constatar que um punhado de jovens usa seus dias de férias universitárias para desenvolver um programa tão variado e rico como o que acabei de ler, é pra se orgulhar e muito, é pra se sentir esperançoso e otimista com o desempenho que esta juventude vai ter na vida sócio-política de nossa pátria.

A única razão para tristeza que me invade a alma neste instante é a minha impossibilidade de estar presente, de usufruir de uma semana tão fértil em cultura, lazer positivo, arte e debates de conhecimento. Como gostaria de participar do encontro com o Darcy Passos, meu companheiro de experiência com a Ditadura militar. Como o Darcy eu também amarguei duas décadas de minha vida e de minha sofrida família, privado de meu trabalho, impedido de aceitar trabalho em universidades do exterior, porque não me concediam passaporte, 20 anos de isolamento, em que as pessoas me olhavam de esguelho, porque ouviram dizer que eu era um perigo para a sociedade. O Darcy vai relatar a sua experiência, que não fica longe da minha. E tudo por nada! Fomos absolvidos, nada conseguiram provar contra nós, embora buscassem avidamente estas provas, eu recebi um documento do Governo do Estado de São Paulo me pedindo “desculpas” pelo engano e ficou por isto mesmo. Os que espalharam que éramos subversivos e nocivos à sociedade não tiveram a dignidade e a grandeza de espalhar a nossa absolvição, nem o pedido de desculpas que recebemos foi para o noticiário midiático.

Meus bons amigos de Itápolis, vão ouvir o Darcy Passos, vão ouvir e aprender com os expositores Rogério Denyz, Fábio Mendonça e Edson Bariani, que vão tratar de um tema atualíssimo que é o “mal do século”, a depressão. Transtornos psíquicos e padecimentos mentais são a característica  mais cruel do drama que se alastra entre nós, talvez conseqüência do grande conflito que vitima o homem atual, conflito causado pela coerção social que o impele a competir o tempo todo e cada vez mais, talvez o primeiro castigo à sociedade como um todo, por subestimarmos tanto os valores espirituais e morais, massacrados que somos pela grande tarefa, a de matar um leão por hora, logo, por minuto!

Parabens à AIA, felicitações ao Túlio Belanda, boa sorte a vocês jovens valorosos que só engrandecem a raça humana e fazem a gente reviver a alma rica de humanismo que imperava na minha mais tenra Itápolis.