Histórias que não foram escritas

Orestes Nigro

Diário de Itápolis - Aeroclube!

Início da construção do 1º hangar do Aero Clube de Itápolis

Pouco tempo depois daquela Festa Aviatória da fazenda do Major Novaes, começamos a ouvir notícias da construção de um campo de aviação em Itápolis, com uma pista de pouso e decolagem para pequenas aeronaves. O lugar escolhido foi uma área a cerca de 2 quilômetros da cidade, à margem esquerda da estrada ´para Borborema, defronte à fazenda do Ciniro Massari. Ali seria construído um hangar, palavra nova para a gente. Hangar, a garagem para aviões. Aquilo teve uma repercussão enorme no meio da população da cidade, principalmente entre os jovens.

 

Aos domingos era comum virem pousar no nosso Campo de Aviação, alguns Teço-tecos, também conhecidos como Paulistinhas que realizavam vôos turísticos pagos, levando os empolgados itapolitanos aos céus da cidade, realizando sobrevôo de 20 minutos. A maioria desses aviões vinha de Araraquara. Entre eles vinha o infalível vermelhinho Stinson, que brilhou na festa da Fazenda Novaes.  Eram as primeiras atividades do futuro Aeroporto Dr.Luís Dante Santoro, que abriga nosso prestigiado Aeroclube.

1944 - Início da cobertura do hangar do campo de pouso do Aero Clube de Itápolis, fundado em 13 de maio de 1941, sob a presidência do Prefeito Municipal Dr. Joaquim de Almeida Veloso

Lembro-me bem da chegada do nosso primeiro Teco-teco, de prefixo PP-RJJ, com sua cabine azul e suas asas amarelas.  O segundo Paulistinha era também azul e amarelo, um azul mais claro, cujo prefixo era PP-HAK. Nesta época um itapolitano se destacou nas atividades do nosso aeroclube, o competente mecânico Armando Brunelli, o Tito. Ele dava suporte aos pilotos, aos instrutores e de forma autodidata, tornou-se um perito na manutenção das duas aeronaves de nosso aeroclube. Irmão de um dos pilotos mais atuantes na época, o Professor Renato Brunelli, Tito dedicava parte do seu tempo, de forma voluntária e gratuita, às atividades da nova agremiação. Seu sonho de ver aquela semente florescer vingou e temos hoje um dos aeroclubes mais conceituados do país, com excelente estrutura e know-how.

A paixão por aviões, o sonho de voar parece ser uma característica nata dos habitantes desta nossa cidade. Durante o tempo em que aí vivi fui testemunha de muitos gestos de cooperação, de devoção mesmo pelas atividades aeroclubísticas. Destaco a participação de uma criatura que sempre admirei, como homem público e como ser humano, o Sr. Emílio Mucari, o Camilo. Tinha paixão pelos aviões, foi um dos presidentes mais entusiasmados de nosso aeroclube. Com seu irmão Abib, deu grande estímulo às atividades aviatórias. Outro cidadão que se lançou na aventura de voar, Dr. Edson Caivano, também foi dirigente do nosso  Aeroclube. Lembro-me também da participação entusiasmada de um cidadão de natureza pacata, um homem retraído, de pouco convívio social, o dentista Regis, que quando o assunto era aviões, vôos, aeroclube, se inflamava, nem parecia mais o mesmo. Se filho Silas costumava comentar: “quando fala de aviação, meu pai volta a ser criança”.

 A história de nosso Campo de Aviação é repleta de lances felizes, mas registra também algumas ocorrências marcadas pela tragédia. A primeira foi a queda do nosso PP-RJJ. Já bem ´próximo da aterrissagem, no fundo da mata da Fazenda Massari, por causa da ruptura de uma das asas, ceifou a vida  do Professor Renato Brunelli. Outro itapolitano entusiasta do nosso Aeroclube, foi o jovem Fuad Mucari, estudante de Odontologia em Ribeirão Preto, depois de passar um fim de semana em atividades no nosso Campo de Aviaçao, na companhia dos irmãos Brunelli, perdeu a vida num acidente com o avião que pilotava, de volta a Ribeirão Preto. E muitos anos depois, já nos anos 60, a trágica morte de meu sobrinho Luís Carlos Nigro Mazzo, filho do Jacintho e de minha irmã Zizinha, nos seus tenros 16 anos, aluno do curso de pilotos.

Eu fui um dos maiores apaixonados pelos aviões, por voar, pelo nosso Aeroclube. Ainda menino fui à festa dos Novaes e vi em terra aquelas máquinas que me encantavam quando cruzavam os céus de Itápolis, voei no colo do meu pai no Stinson vermelhinho naquele domingo mágico de minha infância e ia começar o curso de piloto, a convite do meu querido Renato Brunelli, quando fui amargurado com sua morte. Naquela trágica tarde, minha mãe, sabedora de meus projetos, sentenciou: “Meu filho. Se você persistir nesta idéia de voar, pode se vestir de luto, porque sua mãe vai morrer de desgosto!” Enterrei ali meu sonho, para não passar minha vida em pesadelo.