Francisco José Santarelli

Memórias Políticas

 

 

"Dona Ignês Mursi"

Em minhas memórias políticas, não poderia deixar de homenagear nossa saudosa e querida Dona Ignês Mursi, parteira que, nas décadas de 20, 30 e 40, prestou relevantes serviços a nossa população, pois a bem da verdade, em quase todos os partos, ela se fazia presente e somente quando de uma necessidade médica é que ela recorria, bem como parte de nossa população, à Santa Casa de Misericórdia.

Dª Ignês Mursi

Nessa época, meus pais moravam no bairro do Monjolinho, onde minha mãe foi a primeira professora, contratada então pelo Major Novaes e, segundo minha saudosa mãe, foi Dona Ignês quem fez o parto em que nasci nos idos de 1931.

Dona Ignês foi homenageada com justeza com o nome de rua em nossa cidade, no bairro Jardim Campestre.

Evidentemente, com os avanços técnicos e científicos na Medicina, houve um grande movimento para que nossa população fosse beneficiada com essas melhorias e dois provedores de então, Dr. Eduardo Amaral Lyra e Dr. Antonio Melucci se empenharam e conseguiram construir respectivamente a Maternidade Dona Julieta Lyra e o novo Pavilhão e Centro Cirúrgico que hoje ostenta o nome de seu idealizador (Dr. Melucci).

 A partir de então, caíram em desuso em nossa cidade os serviços prestados pelas parteiras.

Ao inaugurar a Maternidade, seu provedor, Dr. Eduardo do Amaral Lyra recebeu a visita do Governador Dr. Lucas Nogueira Garcez, quee em seu discurso, evidenciou o progresso e a evolução da Medicina, trazendo assistência de primeira às parturientes de nossa cidade.

Quando candidato ao governo do Estado, o então industrial, Antonio Ermínio de Moraes (recém falecido), em visita a nossa cidade e ao Hospital e Maternidade, teceu críticas ao antigo pavilhão, pois naquela época o mesmo estava para ser reformado.

Mas ao adentrar a Maternidade e Centro Cirúrgico, afirmou que Itápolis e região estavam no caminho certo, pois o que viu no Centro Cirúrgico era, talvez, o melhor que tinha visto no interior paulista.

O discurso do Dr. Lyra na inauguração da Maternidade, foi uma brilhante peça de literatura e eu, como seu amigo e companheiro político, juntamente com Dr. José Antonio Trevisan tomamos o cuidado de preservá-lo.

Daí a razão de publicá-lo nessa minha crônica prestando assim uma homenagem ao saudoso amigo, Dr. Eduardo do Amaral Lyra, médico operador, Deputado Estadual, Prefeito e Presidente da Câmara em nossa cidade em um curto período, pois passávamos transitoriamente de uma ditadura para a democracia.

Discurso do Dr. Eduardo do Amaral Lyra na inauguração da Maternidade Dª Julieta Lyra

Dr. Lyra discursando na inauguração da Maternidade Dª Julieta Lyra

1-Leão Machado, 2: Feres Jr., 3: Dr. Eduardo Amaral Lyra, 4: Governador Lucas Nogueira Garcez, 5: Dep. Queiroz Filho, 6: Dep. Ferreira Kefler, 7: Dr. Walter Salin Haddad, 8: Tarquinio Bellentani, 9: Vereador Antonio Coletti, 10: Prefeito Dr. Romeu Gialdini Stella

Discurso do Dr. Eduardo do Amaral Lyra na inauguração da Maternidade Dª Julieta Lyra

Há menos de um ano, no alto desta cidade se fincava a estaca por onde se altearia esta casa que hoje V. Exa. Inaugura.

Era a semente de um sonho longamente acalentado que germinava. Horas longas de angústias, de sofrer vendo o sofrimento alheio deram-nos a firme deliberação de lutar por um Hospital melhor.

E, permita, Prof. Lucas Nogueira Garcez, que evoque, neste instante as palavras que então proferia:

- Estamos e, assim o entendemos, cumprindo a missão mais nobre que pode alguém almejar: tornar mais forte a Pátria que um dia  nossos maiores fizeram maior.

Estamos lutando para que não mais se reproduza o doloroso quadro da jovem mãe vitimada pela ignorância de que não é culpada, minada por doenças que se não fossem cruéis deveriam respeitar seu corpo sagrado, pugnando para que ela não mais se sinta morrer, ainda dentro do próprio vente, o fruto do amor.

A nossa batalha é para que não mais se repita a velha e sempre renovada tragédia da jovem mãe, que procura, em vão, abrigo para ver nele realizado o maior milagre do mundo. Da história nos ficou indelével a imagem da Virgem Maria, sombra azul na superfície branca dos desertos que em estábulo humilde encontrou seu oásis. Tinha por si Deus – Seu Deus – Nosso Deus que, por maravilha suprema, trazia no próprio ventre. E a nossa pobre mãe brasileira? Traz no seio o fruto do amor e da dor.  Mas onde, o abrigo que a técnica moderna exige? Onde, o amparo seguro indispensável para que ele vingue, cresça? Onde, a mulher da roça, essa heroína desconhecida, irá saber que deveria procurar em tempo, médicos especialistas para orientação adequada? Onde, Deus meu? Estas palavras que proferi quando lançamos a Pedra Fundamental dessa Casa. E dez meses passados, os operários de Itápolis, a quem rendemos nossa melhor homenagem, liderados por esse engenheiro moço, brilhante e capaz que é o Vereador Dr. Dante Compagno, venceram a batalha contra o tempo. Nela e por ela derramaram o suor de dias exaustivos de trabalho. Fizeram-na com o próprio coração, mais que com as mãos fortes e honradas. Aí está pronta para receber, neste instante, as bênçãos do céu através das mãos de apóstolo de Frei Duarte e Silva, a casa que dentro em breve receberá a suprema bênção da terra pela maternidade.

Aqui ocorrerá o sempre novo milagre que se repete todos os dias, todas as horas, da célula que cresce, se multiplica e que um dia recebe o sopro divino da alma.

A velha, sempre nova e sempre linda, emoção da mãe que sofre ao ver nascer o filho da própria carne e que paradoxalmente mistura lágrimas que são puras gotas de luz ao sorriso largo que é a cristalização do amor.

Aqui, a mulher terá a assistência que merece. Sua vida duas vezes preciosa não correrá risco inútil. Aqui, seu corpo e sua alma terão o amparo que merecem, o que infelizmente, Sr. Governador, não ocorre em todo o Estado, onde apesar de todos os esforços dos poderes públicos ainda se vê a mancha triste da drama da mulher que vai ser mãe e que é pobre. Dor que se repete até ao infinito, vendo morrer antes de nascer, o filho do amor.

Drama que se amplia desmedidamente pela ignorância que às vezes se confunde com a maldade pelas distâncias que se alargam entre os centros de recursos e os mais desprovidos, criando o absurdo de dar mais direito à vida a quem mora mais perto das grandes cidades.